Doçura no Teu Olhar
Capítulo 2
Na manhã seguinte, mal chega ao seu gabinete na MOVE e liga o computador, o seu coração acelera quando vê que tem uma mensagem na caixa de correio, de Miguel.
Abre-o e, tal como tinha prometido, cá está o convite para o congresso que lhe falou na véspera.
De: Miguel Andrade
Para: Sara Perdigão
Assunto: Congresso
Data: 11 de Fevereiro de 2014 08:41
Olá Sara. Espero que tenhas dormido bem e que tenhas tido bons sonhos.
Tal como prometido, envio-te em anexo o programa do congresso.
Analisa-o, pensa bem e espero que resolvas fazer-me companhia.
Vais ver que vai ser interessante.
Fico à espera que me digas: “Sim, eu vou”.
Beijos
Miguel
Como seria de esperar, Miguel é incapaz de resistir a provocá-la e Sara sabe que muito do que está escrito na mensagem, se refere a muito mais do que o congresso. As intenções dele são óbvias e ele não faz nada para as esconder, pelo contrário, é bem explícito.
- Oh Sara, Sara, acho que estás a ficar maluquinha. É claro que o Miguel está só a falar do congresso. Estás a ver mais coisas do que as que existem na realidade. Ainda te desiludes outra vez – diz ela para si mesma, tentando convencer-se que está a imaginar coisas, embora, no seu íntimo, saiba que não está errada.
Para dar um ar profissional ao assunto, resolve responder-lhe.
De: Sara Perdigão
Para: Miguel Andrade
Assunto: Congresso
Data: 11 de Fevereiro de 2014 09:21
Olá Miguel, bom dia.
Obrigada pelo convite. Vou ver a minha agenda e, até ao fim da semana, dou-te uma resposta.
Beijo
Sara
E assim, tem quatro dias para decidir o que fazer.
Analisando o programa do congresso, tem que dar razão a Miguel quando ele diz que é muito interessante e que será bom para eles.
O que a preocupa é o que ele quer dizer quanto a... “Vai ser interessante”.
A que está ele, ao certo, a referir-se?
Bom, o melhor será pensar no assunto com calma e, focada apenas na vertente profissional, decidir se pretende acompanhar o “amigo” que teve a “amabilidade” de a convidar.
Neste momento tem uma série de trabalho a fazer. É preciso gerir a MOVE com a cabeça bem assente nos ombros, principalmente, depois de um desfile com tanto sucesso, como o de ontem, e de uma revelação como a que, finalmente, fizeram. Os próximos dias vão ser bem trabalhosos, com muitos pagamentos a fazer, relativo ao trabalho que lhes foi prestado e, por certo, com uma chuva de encomendas que terão que ser devidamente acompanhadas para que nada falhe, como sempre habituaram os seus parceiros.
Por isso, Sara entrega-se ao trabalho, consultando os diversos departamentos, assegurando-se que tudo corre sobre rodas e que nenhum grão de areia faz emperrar a sua engrenagem.
Apesar disso, não consegue evitar que as lembranças de Miguel lhe ocorram à mente, várias vezes, ao longo do dia.
Por vezes, dá por si a sorrir, mas, de imediato, afasta os pensamentos e volta a concentrar-se no trabalho.
Depois da última desilusão que sofreu com um homem, desenvolveu a capacidade de ocupar a mente com o trabalho, o que lhe tem permitido evitar muito sofrimento. Assim que os pensamentos tentam atormentá-la, ela consegue fugir-lhes e dedicar toda a sua atenção ao trabalho, por isso, apesar de tudo o que lhe aconteceu, na MOVE, o seu desempenho foi sempre irrepreensível.
Muitas vezes, as amigas ficaram preocupadas com ela, até que perceberam que foi a forma que arranjou para sobreviver, se bem que, ela sempre foi óptima a separar a sua vida pessoal da vida profissional. Normalmente, Sara sempre separou bem estas duas facetas e, por norma, uma não influencia a outra.
Hoje, mais uma vez, é o que está a fazer. Aqui na MOVE, ela está dedicada, de corpo, alma e coração, à empresa e nada mais se intromete. Quando chega a casa, a história é outra. É aí que chora as suas dores ou ri das suas alegrias.
Desta forma, Sara ocupa os dias que se seguem.
Beatriz e Rita, cujo trabalho é preocuparem-se em criar coisas maravilhosas que deliciem as suas clientes, o que pode ser feito em qualquer lugar, passam muito tempo fora da empresa e não têm qualquer horário ou obrigação de permanecerem na mesma, mas, ultimamente, a maior parte do tempo, é lá que estão. Assim, Sara tem tido a companhia das amigas e sócias que, com ela, têm vivido o furor do sucesso da última colecção e todas vibram com o que está a acontecer. Até Cristina, sempre que as consultas lhe permitem, corre para a MOVE, onde se delicia com as novidades.
Estão numa fase boa e estão a adorar.
As encomendas sucedem-se e há muito trabalho para fazer, mas foi para isto que elas tanto têm trabalhado.
Sara tem toda a gestão financeira para fazer e, com todo este movimento, tem que ser muito cautelosa pois, qualquer descuido, pode ser desastroso. Mas a verdade é que ela adora todo este trabalho, que lhe dá a adrenalina que ela precisa.
Quinta-feira chega e, embora a semana ainda não tenha terminado, por isso, Sara ainda tem tempo para dar uma resposta a Miguel, ele está impaciente por ainda não ter a resposta que tanto deseja.
Aliás, impaciente não é bem o termo que define o seu estado, desesperado aproxima-se mais da realidade.
Por esse motivo e incapaz de ficar parado à espera, decide forçar um pouco o destino, na esperança de obter a resposta mais rapidamente.
Durante a habitual pausa para o café, que faz com os amigos e sócios a meio da manhã, estando todos na copa da StarCom, Miguel tenta a sua sorte.
- Então e como é a vossa vida hoje? Almoçamos juntos? – pergunta Miguel, tentando mostrar o seu ar mais descontraído.
- Não tenho nada marcado. Por mim, podemos almoçar juntos – é a resposta de Filipe.
- Eu ainda não sei, mas devo ir almoçar com a Rita.
- E vão só os dois? – é exactamente desta resposta que Miguel precisa. Agora, contra o que seria normal do seu comportamento, só tem de arranjar forma de ser convidado para este almoço.
- Acho que vamos os dois, a Sara e a Beatriz. Porquê? Queres vir almoçar connosco?
- Se me convidares, quero.
- Humm, qual é o teu interesse? – João observa o amigo.
- Quero vê-las e saber como estão as coisas, depois de segunda-feira.
- Não seja por isso, eu posso dizer-te, não precisas de almoçar com elas – João não resiste a provocá-lo e quer obrigá-lo a confessar qual o seu verdadeiro interesse.
Miguel fita João, com um sorriso que mostra saber exactamente o que ele pretende.
- João, vá lá, convida-o para o almoço porque ele está com saudades da Sara – Filipe preenche o silêncio que Miguel se recusa a preencher.
Riem-se pois, todos sabem exactamente o que está por detrás de tudo isto.
Miguel alcança o objectivo e tem almoço marcado.
- Bom, sendo assim, eu também vou, para fazer companhia à Beatriz, já que a Sara e a Rita vão estar entretidas – refere Filipe.
- Lamento muito por ti, amigo, mas, ao que parece, a Cristina está ocupada com consultas e o almoço deverá ser fora de horas – diz João.
- Não tem problema, se eu quiser vê-la, convido-a directamente, não preciso das artimanhas do nosso amigo – responde Filipe.
- Vão-se lixar, os dois – Miguel sai da copa a rir, feliz com o almoço que vai ter.
À hora do almoço, em vez de aparecer apenas João, este faz-se acompanhar por Filipe e Miguel, para surpresa de Sara.
Ao saírem a porta do edifício onde a MOVE está situada, Sara fita Miguel e, subitamente, sente como se o estivesse a ver pela primeira vez.
Todo o seu charme e sensualidade atingem-na profundamente. O sorriso que normalmente oferece a quem o rodeia, acelera-lhe o coração e, quando os seus olhares se cruzam, os olhos de Miguel iluminam-se e o brilho parece aumentar. Sara hesita por instantes nos seus passos e uma tontura atinge-a, o que a faz estacar.
Apercebendo-se da reacção que lhe provocou, Miguel acerca-se dela.
- Olá meu doce, está tudo bem contigo? – pergunta Miguel, enquanto a cumprimenta com um beijo demorado na face e as mãos a segurarem-na nos cotovelos, dando-lhe o apoio que ela, de repente, necessita.
- Olá Miguel. Sim, estou óptima e tu?
- Ao pé de ti, estou sempre bem – sussurra-lhe com o seu ar atrevido.
- Fico feliz por saber que te proporciono momentos agradáveis – responde Sara com sarcasmo.
- Se tu quiseres, podem ser muito mais agradáveis para os dois, garanto-te.
- Miguel, não comeces – Sara acaba por sorrir.
Seguem para um dos restaurantes que fica próximo da MOVE e, chegados lá, Miguel arranja a forma de se sentar em frente a Sara, o que lhes dará a oportunidade de conversar durante o almoço.
- Então, como estão as coisas na MOVE, depois de segunda-feira? – começa ele por perguntar.
- Bastante movimentadas – Sara mostra um sorriso, no qual se percebe o quanto ela gosta do que faz e do prazer que obtém com isso, – mas está a ser fantástico. A colecção é fabulosa, mas acho que o facto de termos revelado a identidade da Rita, fez disparar, ainda mais, as encomendas.
Está uma verdadeira loucura, mas das boas. Acho que tenho que rever todos os cálculos das minhas previsões e orçamentos.
- Se precisares de ajuda para alguma coisa, sabes que podes contar comigo.
- Não vai ser preciso, mas obrigada, qualquer das formas.
- É maravilhoso ver como os teus olhos brilham, quando falas do teu trabalho. Dá para ver como estás feliz.
- Estou mesmo, acredita.
Entretanto, chegam os pedidos e começam todos a comer, ao mesmo tempo que os amigos vão conversando. Sara e Miguel mantêm-se por alguns momentos em silêncio, apreciando a comida e ouvindo a conversa que acontece no resto da mesa.
Miguel repara na forma como Sara finge comer quando, na realidade, está apenas a depenicar a comida que tem no prato.
- O que se passa, não tens fome? – inquire Miguel.
- Não, nem por isso. Fiz um lanche a meio da manhã e ainda não tive tempo para o digerir, acho eu.
- Com tanto trabalho, convém que te alimentes, caso contrário, não há contas que batam certas.
- Humm – Sara sorri, – acho que tens razão – e começa a esforçar-se por comer alguma coisa.
- Posso perguntar-te se já pensaste no meu convite?
– Miguel não resiste e faz a pergunta que tanto o tem incomodado nos últimos dias.
Sara levanta os olhos até encontrar os de Miguel e percebe que o brilho que habitualmente os ilumina, foi substituído por sombras de ansiedade, o que prova que o seu interesse vai muito além da parte profissional. Miguel não consegue esconder os nervos que sente, apesar de se tentar mostrar descontraído.
Ela sabe que, se quer manter-se afastada dos avanços dele, o melhor que tem a fazer é recusar o convite, no entanto, ignorando o que o seu instinto lhe grita, resolve, pelo menos desta vez, deixar a cautela e o bom senso de lado e aceitar.
- Sim Miguel, já vi o programa e acho que tens razão. É realmente interessante.
- Então isso quer dizer que aceitas?
- Aceito. Eu vou contigo, – confirma ela, o que restitui o brilho aos olhos de Miguel, ao mesmo tempo que ele solta um suspiro de alívio, – mas quero que fique bem claro que vamos apenas pelo congresso – diz ela a sorrir, tendo captado a reacção dele à sua resposta.
- Claro que sim, Sara – o seu bom humor regressou. – Hoje à tarde já confirmo as reservas para os dois. Entretanto, devíamos combinar encontrarmo-nos..., talvez amanhã, para tratar das reservas do hotel, o que me dizes?
- Hã?! – Sara não tinha pensado neste pormenor. Com tantas imagens de Miguel que lhe têm vindo à mente, juntar na mesma, a ideia de Miguel e hotel, provavelmente é mais do que ela consegue aguentar.
- Posso fazer a reservas, se quiseres, visto que andas tão ocupada, mas prefiro escolher o local contigo. Afinal, é para ficarmos os dois, por isso, quero que seja um sítio que te agrade.
- Fazemos como achares melhor – acaba Sara por concordar.
- Então nesse caso, jantamos amanhã e tratamos dos pormenores. À tarde mando-te uma mensagem com as informações todas.
- Combinado.
Miguel está radiante. O seu plano não podia ser mais perfeito. Para além de ter almoçado com Sara e ter conseguido a resposta positiva que tanto ansiava, ainda conseguiu marcar um jantar para o dia seguinte e viu perfeitamente como ela está, cada vez mais afectada por ele. Miguel sabe que a resistência dela está a diminuir. Só precisa de ser paciente e continuar a seduzi-la.
Sara está consciente do rumo que as coisas estão a tomar, mas neste momento, o pensamento dela é apenas um: “Que se dane. Tenho sido sempre cautelosa e sensata e vejam bem onde me tem levado. As desilusões têm-se sucedido, por isso, desta vez, não quero saber.”
Apesar da sua decisão determinada, o pouco apetite que sentia, desapareceu e foi substituído por um aperto no estômago tão grande, que o reduz tão drasticamente, que ela tem a certeza que, neste momento, nem uma azeitona lá cabe, quanto mais a comida que tem à sua frente.
Algo lhe diz que está metida em apuros, no entanto, está cada vez mais tentada a vê-los com os seus próprios olhos e, por todas as promessas implícitas no olhar de Miguel, a senti-los no próprio corpo. Todos estes pensamentos fazem afluir o sangue ao seu rosto e acelerar a respiração e o batimento cardíaco e, Miguel não deixa escapar nenhum destes pormenores.
- Bom, pelo que vejo, não vais comer nada. Vê lá, não vás ficar doente.
- Não te preocupes porque eu nunca fico doente.
Durante o resto do almoço, a conversa, entre todos, flui com normalidade e Miguel resolve dar-lhe algumas tréguas. Tudo o que lhe dedica é a sua atenção, evitando qualquer tipo de provocação. Ele viu a forma como ela ficou perturbada e agora, que tem o convite aceite, não quer dar-lhe motivos para voltar atrás com a sua decisão. Até o facto de ela estar sem apetite é indicador que não a deve pressionar muito.
Assim, na despedida, de volta à porta da MOVE, ele dá-lhe um beijo na face e confirma que lhe vai mandar os detalhes que ela precisa.
- Sara, durante a tarde combinamos para amanhã, certo?
- Certo, fico à espera.
- Até logo e cuida-te.
- Já te disse para não te preocupares – Sara sorri pois, não consegue deixar de achar engraçada a forma como ele parece preocupar-se genuinamente com ela. É uma atitude e um comportamento que a enternecem.
- Vou tentar.
Já na MOVE, Sara volta a embrenhar-se no trabalho, como é seu hábito, embora, uma certa imagem, de um certo homem, lhe ocorra à mente, diversas vezes, as quais, ela trata de afastar rapidamente.
Na StarCom, Miguel não consegue deixar de pensar na morena que o atormenta cada vez mais. Está eufórico por ela ter aceite o seu convite, agora só espera conseguir convencê-la a aceitar todos os planos que ele quer incluir nesse convite. A prova de fogo será no jantar que têm combinado para o dia seguinte e ele espera não estar a ser demasiado ambicioso nos seus planos.
Miguel sente que Sara está a diminuir a sua resistência em relação a ele, por isso, decidiu arriscar mais alguns passos em frente.
Há, no entanto, uma coisa que o está a incomodar desde o almoço. Sara mal tocou na comida que tinha no prato e ele sabe que, normalmente, ela não sofre de falta de apetite, por isso, subitamente tem uma ideia e resolve pô-la em prática. Espera agradar-lhe.
Às dezasseis horas e trinta minutos em ponto, Sara é chamada à recepção da MOVE. Sai do gabinete e encaminha-se para a recepção onde vê Andreia acompanhada por um homem, que percebe ser alguém que vem fazer uma entrega de alguma coisa. Só não entende por que razão Andreia não recebeu a encomenda, como é costume.
- O que se passa Andreia?
- Sara, está aqui este senhor para lhe entregar uma encomenda e insiste que tem que a entregar a si, em mãos. Diz que tem indicações expressas para que a encomenda nãoseja entregue a mais ninguém – explica a recepcionista.
- Que estranho! – Sara não se recorda de ter feito qualquer encomenda ultimamente. – Ok Andreia, vou tratar do assunto, não se preocupe.
Dirige-se ao estafeta para esclarecer a situação e, ao mesmo tempo, satisfazer a sua curiosidade.
- Boa tarde. O meu nome é Sara Perdigão e parece que tem uma encomenda para mim. Do que se trata?
- Boa tarde, tenho esta encomenda que me disseram que teria que ser entregue a si. Importa-se se assinar aqui, por favor? – e entrega-lhe o habitual formulário de recepção de encomendas, para ser assinado.
- Claro – Sara assina e recebe a embalagem que não reconhece.
Agarrada à embalagem vem um cartão com instruções impressas.
“Para abrir quando estiveres sossegada no teu gabinete. Um amigo que não se preocupa.”
Sara esboça um sorriso quando a imagem de Miguel lhe vem à cabeça. O que será que ele inventou desta vez?
Sem dúvida, o seu empenho é notável.
Voltando à realidade, agradece ao homem que acabou de conseguir desempenhar o seu trabalho com sucesso, esboça um sorriso a Andreia em tom de agradecimento e volta ao seu gabinete. Está curiosa e quer ver o que a embalagem contém.
Pousa o embrulho em cima da sua secretária e começa a abri-la cuidadosamente. Quando, por fim, o seu conteúdo se revela, Sara senta-se na cadeira, recosta-se e, a fitar o que tem em cima da secretária, pega no cartão que vem no seu
interior e não consegue deixar de rir, enquanto começa a ler as palavras escritas pela mão de Miguel, cuja letra ela reconhece sem dúvida.
“Não estou preocupado, mas também não quero que passes fome e, como não tocaste no almoço, pelo menos, espero que lanches. Não quero que venhas a recusar o meu convite por estares sem forças ou doente. É egoísmo da minha parte, mas não quero ir sozinho, por isso, zelo pelo teu bem-estar.
Bom apetite.
Beijos
Miguel (um amigo que não está preocupado)”
Decididamente, Miguel está a seduzi-la, mas também está louco. Sara ri-se, ao mesmo tempo que olha a cesta que está à sua frente e, da qual, constam vários acepipes que Miguel lhe enviou para o lanche. Ali tem iogurte, fruta, croissant, pastel de nata, bolos secos, leite com chocolate, néctares de fruta, enfim, tudo o que ele sabe que ela gosta pois, ao longo dos últimos anos, tiveram muitos lanches juntos e ele pôde aprender o que lhe agrada.
Nesse instante, Beatriz entra no gabinete de Sara e surpreende-se com o riso dela e com tudo o que está em cima da secretária.
- O que é isto? Mandaste vir lanche? – inquire Beatriz.
- Não, nada disso. Alguém está preocupado com o meu bem-estar.
- Quem?
- O Miguel – diz Sara, fitando a amiga para ver a sua reacção.
- O quê? Não estou a perceber.
- Como comi pouco ao almoço, ele está preocupado que eu possa ficar doente e, por isso, mandou-me o lanche. Ah, a propósito, ainda não vos disse, mas o Miguel convidou-me para um congresso nos dias vinte e sete e vinte e oito deste mês, no Porto, e eu aceitei. Vou com ele. É por isso que
ele não quer que eu adoeça, para não ter que ir sozinho. É puro interesse egoísta – ao que ambas desatam a rir.
- Oh Sara, até pode ser interesse egoísta, mas não tem nada a ver com o congresso. Tu sabes que tem a ver contigo. O Miguel está determinado em conquistar-te e tu sabes disso.
- Achas mesmo?
- Tenho a certeza e tu também. Só tens de aceitar, até porque, também tu, não ficas indiferente à presença dele. Quando ele chega ao pé de ti, tu alteras-te, iluminas-te e os teus olhos brilham tanto como os dele. Porque teimas em rejeitá-lo?
- Não sei...
- Claro que sabes. Tens medo que ele te magoe como os outros fizeram e, em vez de o aceitares e dares uma hipótese a ambos, tens-te envolvido com outros homens para o afastar e, com isso, tens sofrido.
- Talvez tenhas razão.
- Tu sabes que eu tenho razão. O Miguel sempre mostrou o que sente por ti e, mesmo quando tu andavas com alguém, nunca escondeu que gosta muito de ti. Talvez por causa do seu ar descontraído e divertido, tu tenhas medo de o levar a sério, mas olha que ele, embora a brincar e a provocar-te, sempre te levou muito a sério.
Sara limita-se a assentir com a cabeça, indicando que está a ouvir tudo o que a amiga lhe diz e que ela sabe que está correcta.
- Lembra-te que nem todos os homens são iguais. Alguns não merecem nem um segundo de atenção da nossa parte, outros merecem toda a atenção que tenhas para dar durante a vida inteira. Talvez o Miguel seja dos que merecem atenção. Pensa nisso.
- Tenho medo de me deixar envolver e, se as coisas não correrem bem, vou perder um amigo e vou dar cabo do nosso grupo de amigos. Não quero isso. Já que não sou feliz no amor, pelo menos quero ser feliz na amizade.
- Não sejas parva. É verdade que tens tido pouca sorte com as tuas relações, principalmente com o Bernardo, esse idiota, mas se te decidires a ter alguma coisa com o Miguel e, caso não resulte, reunimo-nos todos para deixar bem claro que a amizade terá que se manter. Não penses nisso.
- Não sei…
- Minha amiga, faz o que te diz o teu coração. Se decidires avançar e deixar o Miguel avançar, sabes que tens todo o meu apoio e todos do grupo vos irão apoiar.
- Obrigada, eu sei.
- Bom, eu diria que, agora, o melhor é lanchares. Não quero que fiques doente e não possas acompanhá-lo no congresso. Acho que ele nos culparia por abusarmos de ti e trabalhares tanto.
- Então junta-te a mim. Com tudo o que está aqui, dá para vários lanches. Vou convidar também a Rita.
- Ela já se foi embora. Acho que temos que ser as duas a fazer o sacrifício de devorar estas delícias que estão a olhar para nós.
- Então vamos a isso, mas, para que fique claro, eu nunca fico doente – reafirma Sara.
- Eu sei, mas vamos fazer-lhe a vontade e lanchar.
E, desta forma, Sara e Beatriz tomam o seu lanche inesperado e deliciam-se com os cuidados do homem sedutor que, à mesma hora, contorce-se de ansiedade na StarCom, temendo a reacção que Sara possa ter com a recepção da encomenda que, ele sabe, já lhe foi entregue.
Mais uma vez, a ansiedade invade-o e só lhe resta esperar pelo próximo passo. Esta coisa de esperar está a deixá-lo doido. Agora, ele consegue perceber o estado em que João ficou, de cada vez que Rita o fez esperar e desesperar, e foram muitas. Em muitas dessas vezes, Miguel provocou o amigo e agora percebe como ele se sentia. Que Deus o livre de João ter consciência do estado em que ele se encontra neste momento, iria vingar-se de tudo o que lhe
fez.
Uma hora depois da entrega do lanche, Sara recebe uma nova mensagem de Miguel. Ela sabe que já deveria ter agradecido o gesto dele, mas não quer mostrar-se tão vulnerável como está.
De: Miguel Andrade
Para: Sara Perdigão
Assunto: Confirmação de congresso
Data: 13 de Fevereiro de 2014 17:31
Olá Sara, quero que saibas que já confirmei as nossas inscrições no congresso.
Beijo
Miguel
De: Sara Perdigão
Para: Miguel Andrade
Assunto: Obrigada
Data: 13 de Fevereiro de 2014 17:38
Olá Miguel.
Obrigada pelo congresso e obrigada pelo lanche.
Estava maravilhoso, mas não precisavas de ter tido esse trabalho todo. Como te disse, não é preciso preocupares-te
comigo. Eu não costumo adoecer e não te vou deixar ir sozinho. Já te dei a minha palavra e vou cumpri-la.
Beijos e até amanhã.
Sara
De: Miguel Andrade
Para: Sara Perdigão
Assunto: Jantar
Data: 13 de Fevereiro de 2014 17:42
Amanhã digo-te a hora a que te irei buscar a casa para podermos jantar calmamente e combinarmos tudo.
Beijos e bons sonhos.
Miguel