Reencontro
com o Amor

Capítulo 2

Reencontro com o Amor_volume 1 frente


Chegadas à festa, organizada num famoso hotel de Lisboa, em todo o seu esplendor, com os seus jardins magníficos e com a vista sobre o Rio Tejo, que é sempre de cortar a respiração, juntam-se a Sara.

Rita respira todo o ambiente que a rodeia com avidez. Foi deste ar, destas flores que tem à sua volta, deste céu, desta vista da cidade e, claro, das suas amigas queridas, de quem tantas saudades teve, durante os anos que passou pelo mundo fora. Mas, agora está de volta para recuperar tudo isso.

A festa está animada, apesar de todo o ambiente de sofisticação e elegância, mas que não é, de todo, intimidante. Os vários convidados parecem estar, de facto, a divertir-se em animadas conversas.

Nesta reunião encontra-se todo o tipo de pessoas, desde a política, da moda, do espectáculo, empresários, médicos, advogados..., todos estão dispostos a contribuir e, por isso, cá estão, para ajudar as crianças que tanto precisam do seu apoio.

– Acho que não conheço ninguém – refere Rita.

– Será? – pergunta Sara, perscrutando a sala em busca de caras conhecidas.

– Realmente, com tantas pessoas presentes, – continua Beatriz – ainda encontras alguém de quem te lembres.

– Quem sabe se não conheces o príncipe dos teus sonhos – brinca Cristina. – Olha que, bem podíamos encontrar algum jeitoso para cada uma de nós.

– Bem estamos todas a precisar! – exclama Sara. –Acho que preciso de outra coisa na minha vida, para além dos meus queridos números.

– Passas a vida a reclamar dos números, mas a verdade é que não vives sem eles, – troça Beatriz – pois eu não vivo sem os meus trapinhos.

– É um pecado, chamares trapinhos a estas maravilhas que tu desenhas, – elogia Rita. – O teu talento é muito e bem reconhecido.

-Tens razão e sabes bem como isso me agrada, mas relativamente a talento, também não é coisa que tenhas falta.

Rita encolhe os ombros e sorri.

Os convidados vão chegando e Rita vai sendo apresentada a alguns deles, pelas suas amigas que, pelas suas profissões, conhecem a maioria das pessoas presentes.

Alguns são conhecidos, outros são amigos, alguns até, de longa data.

Rita vai cumprimentando todos, com o sorriso que aprendeu a mostrar nestes encontros sociais, participando nas conversas à sua volta, mas sempre com a reserva que lhe

é característica.

– Então, de volta a Portugal? – pergunta um médico, amigo de Cristina, que lhe foi apresentado mas, do qual, não reteve o nome.

– Sim, já tinha saudades de tudo isto, dos amigos, do sol...

– E o que faz na vida, para além de ter viajado muito?

– De momento, quero apenas desfrutar do descanso e depois logo se verá.

Rita pouco revela sobre a sua vida. Tornou-se uma pessoa reservada e, de certa forma, misteriosa, o que muito atrai quem a rodeia, principalmente os homens que estão ávidos por descobrir os enigmas da morena sedutora e com ares de inatingível.

A certa altura, chega um grupo de convidados que desperta o olhar de Rita. Ela continua a beber da sua taça de champanhe e observa que o grupo se dirige para o local onde se encontra com as suas amigas.

É nesse instante que um elemento do grupo cruza com ela o olhar e, o que a faz sentir, não tem descrição possível. Aqueles olhos verdes, olham-na, bem fundo nos

seus e um estremecimento percorre todo o seu corpo. Como é possível? Quem é este homem que consegue fazê-la ter este sentimento tão invulgar nela? Aqueles olhos não lhe são estranhos, mas a quem pertencem?

Rita sente-se a corar e tenta afastar o olhar, mas aqueles olhos impedem-na e, ao mesmo tempo que a atraem, o que a assusta, transmitem-lhe uma mensagem de segurança. Rita não consegue deixar de fitar o homem que se aproxima dela.

– Boa noite. Desculpa a minha ousadia e corrige-me se eu estiver errado mas, tu és a Rita Saraiva, certo?

– Sou sim, e tu és? – diz Rita ao misterioso homem, que sem demoras a abordou, ignorando os restantes membros de ambos os grupos que os acompanham.

– Eu sabia que não estava enganado. Reconhecer-te-ia e, a esses olhos lindos, em qualquer lugar do mundo.

– Rita, – intervém Beatriz, que entretanto se apercebeu da chegada destes convidados – este é o João, o João Santos, nosso amigo da escola, lembras-te dele?

– Ah... o João! – exclama Rita. – Sim, claro, o João. Claro que me lembro. – Como poderia esquecer, foi o rapaz que lhe deu, o que considera, o primeiro beijo da sua vida, e esse nunca se esquece.

Agora, tudo faz sentido. Aqueles olhos verdes eram, sem dúvida, conhecidos e as recordações de outros tempos fazem-na sorrir e o sangue afluir às suas faces.

– Posso abraçar-te miúda? – pergunta João da mesma forma que habitualmente a tratava.

– Oh João, claro que sim!

João e Rita abraçam-se e ele beija-a na face, demonstrando que todos os sentimentos da juventude se mantêm. O toque de João e aquele beijo provocam-lhe um arrepio por todo o corpo. Os olhos de ambos brilham e a felicidade por este reencontro é notória.

– Que saudades que eu tenho de estarmos juntos – diz João ainda com Rita nos seus braços. – Estás uma mulher linda! – sussurra-lhe João ao ouvido.

– Obrigada pelo elogio – agradece Rita, ao mesmo tempo que tenta colocar algum espaço entre eles, de forma a digerir aquele reencontro e os sentimentos que se apoderam do seu corpo e da sua mente. – Quando te vi entrar, julguei que te conhecia de algum lugar, mas não percebi que eras tu. Continuas com o teu olhar sedutor para as miúdas?

– Não sei, isso, só elas poderão dizer mas, hoje, só tenho olhos para ti – e volta a tomá-la nos braços. Como sentiu falta dela durante todos estes anos. Rita e João conheceram-se na escola, quando eram ambos uns adolescentes. Ela tinha, na época, doze anos, era uma morena de olhos castanhos encantadora. Apesar da sua pouca idade, era uma boa amiga, divertida e ao pé de quem, nunca, ninguém conseguia estar triste. Era extrovertida e, como tal, atraía sobre si muitas atenções. Era a miúda descontraída que fazia amigos das mais diversas idades, sendo João um deles, embora ele tivesse, já na altura, dezasseis anos.

Para João, Rita foi sempre a miúda espectacular que, apesar de tão nova, sempre o atraiu pela sua beleza e pela forma de estar e viver a vida. Embora ela não tivesse consciência disso, ele sempre a protegeu dos mais atrevidos que se queriam aproximar dela. Foi sempre uma amiga especial, a quem ele dedicou um carinho muito especial, ou talvez tenha sido mais do que um simples carinho. Em todos estes anos, João sempre a recordou e foi obtendo informações dela, através das amigas, com quem, mantiveram ambos contacto.

Entretanto, todos se cumprimentam e são feitas novas apresentações.

– Rita, este é o Miguel, amigo e sócio, e aqui está o Filipe, também um grande amigo e sócio.

– Olá, boa noite e muito prazer em conhecer-vos – cumprimenta Rita.

– Ora então, tu é que és a famosa Rita, das aventuras da adolescência do nosso amigo João – refere o Filipe com um sorriso.

– Já ouvimos algumas histórias em que participavas activamente – comenta Miguel com um sorriso matreiro.

– Não sei o que vos tem contado o João, da adolescência, mas parece-me que éramos jovens comuns, que faziam as tropelias normais, de qualquer jovem da sua idade

– responde Rita a rir.

– Olá meninos, como estão? – cumprimenta Sara. – Tenham cuidado porque o João sempre foi um bom contador de histórias.

– Sim, é verdade, éramos todos bem pacatos e não fazíamos nada de que nos possamos envergonhar – diz Cristina com um ar angelical. – Sempre nos portámos bem.

– Não duvido nada – responde sarcasticamente Filipe, ao que todos riem.

– Não digo mais nada sem a presença do meu advogado – brinca Cristina com Filipe, aludindo à sua profissão de advogado, a qual, ele desempenha na empresa que mantém com João e Miguel e, da qual, é o Director do departamento jurídico.

– Fazes bem Cristina e, se o teu advogado não estiver disponível, podes sempre ligar-me, para o que precisares –responde Filipe com um piscar de olho. – Para ti, estarei sempre ao dispor.

– Obrigada, não me vou esquecer disso – e Cristina ri, corando.

Todos continuam a conversar pois, fazendo parte dos amigos de longa data, há muita conversa para pôr em dia. Beatriz, Sara e Cristina sempre mantiveram a amizade

com João desde o secundário, sendo através delas que, com a maior discrição possível, João foi sabendo algumas coisas que Rita ia fazendo e, alguns dos sítios por onde viajava. Apesar de cada um ter seguido carreiras bem distintas, a amizade nunca acabou, embora tivessem, por vezes, muito tempo sem que conseguissem falar ou estar juntos mas, quando conseguiam, os laços da amizade lá estavam para os unir e, nunca, o tempo ou a distância, arrefeceram esse sentimento.

João é agora um empresário muitíssimo bem sucedido, no ramo das tecnologias e comunicações, quer a nível nacional, quer internacional, sendo reconhecido pelas suas

inovações, a este nível, nos mais prestigiados e exigentes meios, como por exemplo, a NASA. Tendo conhecido Miguel e Filipe na faculdade, onde a sua amizade ganhou forma, os três amigos não hesitaram em construir, o que agora é um império respeitável, assim que concluíram os seus estudos.

Foram amigos inseparáveis desde os tempos da faculdade, tendo-se apoiado mutuamente e desfrutado dos maus e bons momentos. Cada um é responsável pela sua área na

empresa, que detêm em conjunto. João é o responsável pela tecnologia. Filipe é o responsável do departamento jurídico que, tão eficientemente, tem defendido os direitos e feito valer os valores da empresa de todos. Miguel é o homem dos números, responsável pelo departamento financeiro. É ele que gere o dinheiro da empresa e os patrimónios dos amigos.

Beatriz e Sara são sócias numa empresa relacionada com moda. A MOVE é a empresa onde Beatriz desenvolve os seus talentos na moda. A marca é conhecida mundialmente, quer através das roupas desenhadas por Beatriz, e que tem atingido o maior sucesso nas passerelles mais famosas do mundo, como Paris ou Milão, entre outras, bem como, por todos os acessórios desde as jóias e todo o tipo de adereços e, cujo criador das mesmas, se mantém uma incógnita. Quanto a Sara, é a directora financeira da MOVE, onde os números fazem as delícias da sua vida. Juntas, são a cara da MOVE. Embora, sejam apenas as duas, as amigas estão sempre presentes a apoiá-las nos grandes desfiles. Rita não falhou, até hoje, a um único desfile da MOVE, dando todo o seu contributo e apoio às amigas em tudo o que precisam. Quem vê de fora, diz que se trata de mais uma sócia, e não apenas de uma amiga das sócias, tal o seu empenho em ajudar.

Cristina, por sua vez, é psicóloga e, tendo uma profissão tão distinta das amigas, tenta estar presente para as apoiar, no que sabe, serem momentos de grande tensão, os que antecedem os grandes desfiles onde a MOVE apresenta as suas criações.

Mas, neste momento, em que todos estão a conversar, João só pensa em saber tudo de Rita. O que fez, por onde esteve, com quem esteve, com quem andou – embora este seja um assunto que lhe provoca algum desconforto. Convida-a para um passeio pelos jardins. Rita aceita.

A noite está amena. Estamos em Maio, a temperatura está agradável e os jardins estão resplandecentes nesta época do ano, convidando a um passeio.

João pega-a por uma mão e condu-la por entre os inúmeros convidados, tendo já Rita deixado a sua taça de champanhe, com um dos muitos empregados que circulam na sala.

A mão de João é firme ao agarrar a de Rita. Ele agarra-a com uma firmeza suave, é uma força que demonstra que não quer perdê-la, para ninguém, neste momento, e que deixa Rita perceber que é agarrada pela mão de um homem que sabe exactamente o que quer. O toque das suas mãos provoca, em ambos, um choque eléctrico que, até então, João só tinha sentido uma vez na sua vida e, que Rita experimenta agradada, mas também assustada.

Uma vez chegados ao jardim, o ar fresco toca as faces e as partes descobertas do corpo de Rita, o que lhe provoca um arrepio.

– Tens frio? – pergunta João fitando-a, mas sem lhe largar a mão. – Preferes ir para dentro?

– Não, estou bem, não te preocupes. Acho que lá dentro estava a ficar muito calor. Foi a diferença de temperatura que me fez arrepiar, mas aqui fora está muito mais agradável.

– Então miúda, o que tens feito? Tive saudades tuas –diz João enquanto caminham, sem lhe largar a mão.

– Nada de especial. Viajei muito nestes anos todos, estudei e não fiz muito mais – diz, vagamente, Rita não respondendo ao que ele referiu quanto às saudades.

– Isso é muito vago e parece-me pouco para fazer em doze anos de ausência.

– Sim, dito desta forma, realmente não parece muito, mas as viagens ocuparam muito tempo e tornaram os anos numa corrida.

João pára, agarra-lhe as duas mãos, fita-a nos olhos e pergunta-lhe:

– Estás bem? Pareces-me bastante diferente, mais reservada... não sei, mas acho que perdeste alguma da energia doutros tempos.

– Estou bem, claro que sim – apressa-se Rita a responder – mas, se calhar, é porque já não sou uma miúda de doze anos, agora tenho vinte e quatro anos, é normal que me comporte com mais calma, não?

– Talvez, mas ainda assim... – João inclina a cabeça a examiná-la e não se engana, algo está diferente na sua amiga.

– Estás linda, sabes? Sempre te achei uma miúda fantástica e agora tornaste-te numa mulher linda e maravilhosa.

– Pára com isso, começo a ficar embaraçada com tantos elogios. Aposto que é o teu “Pack Galanteio” a actuar.

– Enganas-te, nunca falei tão a sério, com outra mulher, na minha vida. Tive muitas saudades tuas. Fui sabendo algumas coisas acerca de ti, pelas miúdas, mas desejava o momento em que te veria novamente.

– Também senti saudades de ti, das miúdas e de tudo isto. Nem imaginas, quantas vezes desejei não ter ido embora.

Ao dizer estas palavras, algo altera o olhar e as faces de Rita e, de maneira a disfarçar esse sentimento, que tenta a todo o custo manter bem fechado, no mais ínfimo recanto do seu ser, vira-se e contempla o Tejo sob a luz do luar.

João percebeu que algo a perturbou mas, em vez de fazer alguma referência, aproxima-se por trás de Rita, abraça-a pela cintura e confidencia-lhe.

– Tive saudades de ti e, muitas vezes, nestes anos, perguntei a mim mesmo se os teus beijos continuariam tão bons, como o da nossa despedida.

Ao ouvir estas palavras, Rita estremece e pensa nas muitas vezes que, ela própria, recordou aquele dia e aquele beijo, permitindo-se o contacto mais próximo entre ambos. Perante o seu silêncio, João vira-a e, mantendo uma mão na sua cintura, coloca a outra mão na sua nuca e aproxima os lábios dos de Rita.

O calor daqueles lábios nos seus, espalha-se por todo o seu corpo e, pela primeira vez, em muitos anos, Rita abandona-se ao sabor daquele beijo e nos braços do homem que ocupou os seus pensamentos ao longo de todos aqueles anos. Também ela desejou, inúmeras vezes, voltar a ser beijada por aquele rapaz que, na hora da despedida, lhe deu o seu primeiro beijo cheio de amor e ternura.

Quando os seus lábios, por fim, se afastam, João exclama.

– Maravilhoso! Como sempre recordei.

– Costumas ser sempre tão rápido a obteres o que queres?

– Nem imaginas... mas, dependendo do que me proponho obter, posso ser ainda mais rápido.

– E consegues sempre o que queres?

– Não me posso queixar. Regra geral, consigo. Digamos que sei ser muito persuasivo e aproveitar as oportunidades quando elas surgem e, esta em particular, eu não ia perder por nada deste mundo.

Rita encontra-se num turbilhão de pensamentos e sentimentos.

Este reencontro foi muito melhor do que tudo o que poderia ter sonhado mas, neste momento, estes sentimentos ou uma relação, são tudo o que ela não quer.

Rita regressou a Portugal para se encontrar consigo própria e pretende manter o seu coração intacto e longe de sentimentos que, por experiência, sabe que, no fim, só trazem sofrimento.

Mudando o assunto, pretendendo encerrá-lo ali, afasta-se do abraço de João e pergunta-lhe:

– E tu, o que tens feito?

– Será que posso dizer, como tu, que nada de especial?

– Pelo que a Beatriz, a Sara e a Cristina me disseram, refiro que foram as três, acho que essa tua resposta não é exactamente verdadeira – responde Rita.

– Ok, eu explico. Sabes que eu sempre gostei de novidades e novas engenhocas, como tu própria lhes costumavas chamar.

– É verdade, eu costumava gozar contigo e com as tuas engenhocas – relembra ela, ao que um sorriso lhe surge nos lábios e, por momentos, lhe ilumina os olhos. E este momento não escapa ao olhar, sempre atento, de João.

– Pois então, resolvi seguir o meu interesse e desenvolver algumas engenhocas que têm tido alguma importância em várias actividades.

– Lá estás tu a ser modesto. Não te conhecia essa característica.

– Não lhe chamaria modéstia, só não gosto de andar a gritar aos quatro ventos o que faço. Faço e pronto, percebes?

– Sim, acho que sim, mas pelo que me disseram, trabalhas até com a NASA, isso deve ser mesmo giro.

– É mais do que giro, acredita.

A conversa entre ambos faz parecer que a noite passou num ápice. Tendo estado junto aos outros uma grande parte da noite, para Rita, foi um alívio por já não se encontrar sozinha com ele e, para João, uma sensação de que, apesar da conversa e da companhia agradável, afinal, a noite não foi como imaginou quando os seus olhos se cruzaram.

Chegada a hora da despedida, João oferece-se para a levar a casa, mas Rita recusa e diz-lhe que irá com Beatriz pois, esta noite, ficará em sua casa.

– Bom, está na hora de ir embora, a noite foi longa e estou cansada – informa Rita.

– É uma pena que já tenha acabado, mas agora que estás de volta, podemos encontrar-nos mais vezes, pode ser? – inquire João.

– Sim, claro. Já tens os meus contactos, quando quiseres, liga-me e podemos combinar um café ou um almoço.

– Combinado. Ligo-te depois, prometo.

Aproxima-se dela para se despedir, agarra-a por um cotovelo e, ao dar-lhe um beijo na face que, por momentos, quase toca o canto da sua boca, sussurra-lhe ao ouvido, de modo a que, nenhum dos presentes possa ouvir.

– Adorei este encontro. Acho que não vou dormir esta noite, com a recordação dos teus lábios. Vou sonhar acordado, contigo a dançar nos meus braços.

Rita sente-se invadida por um calor que percorre todas as suas veias e sabe que, para ela, será também uma noite com pouco sono. O beijo, aqueles braços fortes, as danças, os olhares com que a observou toda a noite, tudo isso, mexeu profundamente com as suas defesas. Agora, inquieta e cansada, só quer afastar-se e ir para casa onde, sozinha, porá todos os seus pensamentos em ordem.

Chegadas a casa de Beatriz, vão bem divertidas, a recordar alguns momentos da noite. Rita vai participando na conversa e rindo dos disparates que são ditos, mas a sua cabeça está a toda a velocidade e confusa.

Este encontro inesperado mexeu profundamente consigo e, agora, precisa, urgentemente, de pôr as ideias em ordem e refrear os sentimentos. No entanto, há um momento da noite, que a deixa particularmente desconcertada. A simples lembrança daquele beijo deixa-a cheia de calor. Como foi bom sentir aqueles lábios, novamente, e saber que aquele rapaz, agora um homem, e bem atraente por sinal, continua a beijar daquela forma.

Durante anos, Rita questionou-se como seria beijá-lo de novo e agora, finalmente, obteve a sua resposta, mas em vez de apaziguar a sua mente, pelo contrário, deixou-a inquieta.

– Ai que bom, chegar a casa! – exclama Beatriz. – A festa foi animada, mas estou cansada.

– Sim, bem podes dizê-lo, – concorda Sara – mas foi bem divertida. Há muito tempo que não me divertia tanto, numa festa destas.

– A companhia ajudou bastante e não me refiro só a nós, como também ao trio maravilha – responde Cristina, piscando o olho às restantes. – Eles, hoje, estavam bem divertidos, à excepção do João que, embora divertido, estava muito absorvido aqui pela nossa amiga.

– Pára com isso, não comeces a inventar e a fazer filmes – diz Rita, corando ao sentir-se observada pelas amigas.

– Vá lá, não me digas que não sentiste que o divertimento dele era especialmente para ti – brinca Sara.

– Vocês são mesmo incorrigíveis. Não será normal, ele estar assim comigo? Afinal, das quatro, sou a única que ele não via há doze anos, enquanto que, vocês vão-se encontrando com alguma frequência e, depois, dos três, ele era o único que eu conhecia. Já pelo que pude constatar, vocês conhecem muito bem, tanto o Miguel, como o Filipe, ou estarei a imaginar coisas? – e fita Cristina e Sara que se

fingem despercebidas.

– Sim, ok, venceste. Mas o Miguel e o Filipe são apenas bons amigos, nada do que estás para aí a imaginar – refere Sara.

– Vou beber qualquer coisa, quem me acompanha? – pergunta Beatriz, interrompendo a picardia das amigas.

– Sim, para mim, – diz Cristina – arranja-me qualquer coisa forte.

– Eu quero algo mais doce, um licor qualquer que tenhas por aí.

– Bom, eu só quero uma cama na minha vida, – responde Rita – por isso, se não se importarem, vou-me deitar. E vocês vejam lá o que bebem. Se, se embebedarem,não me chamem – avisa Rita, deixando as amigas na sala a rir e vai para o quarto, tentar que o sono não a abandone esta noite.

– É incrível como, ao fim de todo este tempo, o João ficou, só de a voltar a ver – sussurra Beatriz para que Rita não a ouça. – Ela sempre foi “especial” para ele.

– Sim, mas olha que ela também não ficou nada indiferente – completa Sara.

– Só espero que isto não sirva para ela se fechar mais ainda. O João sempre foi um amigo especial para ela e vocês sabem como ela está, relativamente a manter amizades e relacionamentos.

– Achas que este encontro não foi bom para ela? –questiona Sara.

– Não, não é isso. Acho que foi bom e que ela gostou, mas também acho que mexeu com ela, só não sei bem, de que forma.

– Pois, entendo. Ela ficou extremamente surpreendida quando lhe disse que era o João e ela se lembrou dele –comenta Beatriz – e depois, quando regressaram do jardim, reparei que algo estava diferente. Não consegui perceber o quê.

– Também percebi isso, – diz Sara – ela vinha com uma conversa animada, mas havia mais qualquer coisa. E repararam como o João não a largou a noite toda, nem que fosse só com os olhos.

– Tens razão, quando o meu amigo Tomás a convidou e foram ambos dançar, – diz Beatriz – o João esteve o tempo todo a olhar para ela, eu diria a admirá-la, se não mais, e com olhos de poucos amigos. Parecia ciumento.

– Se vocês pensarem bem, o João sempre foi assim relativamente a todas nós, mas em particular com a Rita –relembra Cristina. – Ele sempre se sentiu responsável por todas nós, mas com a Rita, mesmo sem ela dar conta, ele protegia-a.

Ao ouvirem isto, as três amigas sorriem e lembram a sua adolescência com ternura.

– Aconteça o que acontecer, – retoma Cristina – e eu acho que há muito para acontecer, pelo menos, essa parece-me a vontade do João, o importante é que estaremos aqui todas, para a apoiar – ao que todas concordam.

A conversa continua entre as três e vão brincando quanto ao irem namoriscando e à constante insinuação, por parte de Miguel e Filipe, em relação a Sara e a Cristina. Beatriz, por sua vez, prefere manter-se à distância, a divertir-se com as picardias das amigas, a envolver-se com alguém que, decerto, será do mundo da moda e, ela bem sabe que aí, os relacionamentos não são os mais fiáveis. Ela quer alguém na sua vida, mas não agora. Neste momento, está bem assim, os amigos verdadeiros são o suficiente e não anseia por mais, pelo menos, por agora.